Airas Moniz d’ Asma

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Trovador da fase inicial do movimento trovadoresco, como se depreende do facto de ser o primeiro autor a surgir no Cancioneiro da Biblioteca Nacional, e como parecem, aliás, confirmar as suas duas cantigas conservadas, assaz afastadas dos modelos canónicos posteriores da escola.
Do pouco que sabemos sobre a sua biografia resulta que deverá ser galego e não português, como pensava Carolina Michaelis1 (baseando-se no topónimo S. Lourenço de Asme, freguesia dos arredores do Porto – mas cujo nome, na verdade, é Asmes). De facto, como nos informa José-Martinho Montero Santalha “Asma é topónimo galego bem conhecido, documentado abundantemente já na Idade Média, pois designava toda a comarca arredor da actual vila de Chantada, na parte meridional da actual província de Lugo. O topónimo Asma pervive hoje no nome de várias freguesias e no do rio”2(um afluente do rio Minho).
Resende de Oliveira3, embora referindo a existência de vários homónimos na documentação do século XIII, identificou-o como o escudeiro “Arias Nuni de Asma” que surge num documento de 1224, testemunhando o testamento do galego Pero Fernandes, dito o Dente. Recentemente, no entanto, José António Souto Cabo 4contestou esta identificação, sugerindo que se tratará mais seguramente do cavaleiro Airas Moniz de Asma que, em 1219, detinha a tenência do castelo de Alva, no distrito galego de Búval, Ourense (região à qual vários autores desta primeira geração surgem ligados), sugerindo ainda que poderá ser igualmente o trovador o Airas Moniz cujo testamento, datado de 1230, se conserva na documentação do mosteiro de Oseira. O facto de o trovador Fernão Pais de Tamalhancos, seu contemporâneo, possuir igualmente bens em Asma leva este investigador a colocar a hipótese de ter havido alguma relação social ou familiar entre ambos. Não dispomos, no entanto, de qualquer outro dado documental sobre a sua biografia.
Em relação ao seu percurso inicial, no entanto, será eventualmente de considerar uma hipótese avançada por José Carlos Miranda5, a de Airas Moniz ter viajado para fora da Península, estanciando nomeadamente na corte italiana do poderoso Marquês de Monferrato, grande mecenas da arte provençal, e onde, antes de 1203, encontramos, entre outros, os trovadores Raimbaut de Vaqueiras e Perdigon. O facto de a sua cantiga dialogada (– Mia senhor, venho-vos rogar) se aproximar de um modelo raro mas igualmente seguido por Vaqueiras (que é ainda autor de um célebre descordoplurilingue, com uma das estrofes em galego-português), e a ainda o facto de Perdigon, “referir, na tornada de uma das suas canções, um En’Arias, nome desconhecido em âmbito occitânico” e que poderá ser o nosso trovador, leva este investigador a defender “a franca possibilidade de Airas Moniz, no séquito de alguém necessariamente poderoso, ter visitado aquela corte italiana de grande projeção trovadoresca, confirmando-se assim a sua antiguidade como trovador”.
Noutra ordem de ideias, acrescente-se ainda que, sendo as cantigas de Airas Moniz seguidas imediatamente, no manuscrito, pelas de um trovador com o mesmo patronímico,Diego Moniz, é possível, como sugeriu D. Carolina Michaelis, que ambos fossem irmãos. Já a hipótese de ser igualmente o trovador o Airas Moniz referido por Lopo Lias numa sua cantigaparece mais difícil de confirmar. No entanto, dado a nova cronologia recentemente proposta para D. Lopo Lias apontar exatamente para a mesma época de atividade, e tendo ainda em conta a proximidade de Asma à praça de Lemos, igualmente referida por D. Lopo, esta hipótese poderá eventualmente ser considerada.

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Diogo Moniz d’ Asma

Tímpano San Miguel do Monte (Chantada)
Tímpano San Miguel do Monte (Chantada)

Nada sabemos sobre este trovador, o qual, atendendo à colocação das suas duas cantigas na zona inicial cancioneiro que no-las transmite, deverá ter pertencido à primeira geração de trovadores galego-portugueses. D. Carolina Michaelis1, tendo em conta o seu patronímico, levantou a hipótese de Diogo Moniz ser irmão do trovador Airas Moniz de Asma (os dois autores são, aliás, os primeiros de B), hipótese que tem sido retomada pela generalidade dos investigadores posteriores. De resto, Resende de Oliveira2 informa-nos ainda sobre a presença de alguns homónimos em documentos de mosteiros galegos de finais do século XII e inícios do seguinte, nomeadamente no de Oseira.
Acrescente-se que, pelo índice de Colocci, sabemos que, para além das suas duas cantigas de amor conservadas, os cancioneiros incluíam ainda mais quatro composições suas, hoje perdidas.

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Joham de Requeixo

I

A Far[o] um dia irei, madre, se vos prouguer,

rogar se verria meu amigo, que mi bem quer,

e direi-lh’eu entom

a coita do meu coraçom.

Muito per desej’eu que veesse meu amigo

que m’estas penas deu e que falasse comigo,

       e direi-lh’eu entom

a coita do meu coraçom.

Se s’el nembrar quiser como fiquei namorada,

e se cedo veer e o vir eu, bem talhada,

e direi-lh’eu entom

a coita do meu coraçom.

Os trobadores

trovadores

As cantigas trovadorescas galego-portuguesas são um dos patrimónios mais ricos da Idade Média peninsular. Produzidas durante o período, de cerca de 150 anos, que vai, genericamente, de finais do século XII a meados do século XIV, as cantigas medievais situam-se, historicamente, nas alvores das nacionalidades ibéricas, sendo, em grande parte contemporâneas da chamada Reconquista cristã, que nelas deixa, aliás, numerosas marcas. Tendo em conta a geografia política peninsular da época, que se caracterizava pela existência de entidades políticas diversas, muitas vezes com fronteiras voláteis e frequentemente em luta entre si, a área geográfica e cultural onde se desenvolve a arte trovadoresca galego-portuguesa (ou seja, em língua galego-portuguesa) corresponde, latamente, aos reinos de Leão e Galiza, ao reino de Portugal, e ao reino de Castela (a partir de 1230 unificado com Leão).

Nas origens da arte trovadoresca galego-portuguesa está, indiscutivelmente, a arte dos trovadores provençais, movimento artístico nascido no sul de França em inícios do século XII, e que rapidamente se estende pela Europa cristã. Compondo e cantando já em língua falada (no caso, o occitânico) e não mais em Latim, os trovadores provençais, através da arte da canso, mas também do fin’amor que lhe está associado, definiram os modelos e padrões artísticos, mas também genericamente culturais, que se irão tornar dominantes nas cortes e casas aristocráticas europeias durante os séculos seguintes. Acompanhando, pois, sem dúvida, um movimento europeu mais vasto de adoção dos modelos occitânicos, a arte trovadoresca galego-portuguesa assume, no entanto, características muito próprias, como explicitaremos mais abaixo, e que a distinguem de forma assinalável da sua congénere provençal, desde logo pela criação de um género próprio, a cantiga de amigo.

No total, e recolhidas em três grandes cancioneiros (o Cancioneiro da Ajuda, o Cancioneiro da Biblioteca Nacional e o Cancioneiro da Biblioteca Vaticana), chegaram até nós cerca de 1680 cantigas profanas ou de corte, pertencentes a três géneros maiores (cantiga de amor, cantiga de amigo e cantiga de escárnio e maldizer), e da autoria de cerca de 187 trovadores e jograis. Da mesma época e ainda em língua galego-portuguesa, são também as Cantigas de Santa Maria, um vasto conjunto de 420 cantigas religiosas, de louvor à Virgem e de narração dos seus milagres, atribuíveis a Afonso X. Tendo em comum com as cantigas profanas a língua e eventualmente espaços semelhantes de produção, as Cantigas de Santa Maria pertencem, no entanto, a um tradição cultural bem distinta, motivo pelo qual não integram a presente base de dados.

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